terça-feira, 19 de novembro de 2013

As previsões assustadoramente precisas da ficção científica


Oscar Wilde dizia que a vida imita a arte muito mais do que a arte imita a vida. Já Platão dizia que a arte não passa de uma imitação tosca de segunda mão do mundo realmente real. Assim como a questão levantada pela filosofia pré-socrática sobre o Tostines (Vende mais porque é fresquinho ou é fresquinho porque vende mais?), a relação de influência entre arte e realidade no processo criativo ainda gera muita discussão, sobretudo em grupos de estudantes de artes sob o efeito de ervas alucinógenas. É inegável que a arte no geral retrata, de forma mais ou menos realista, situações da natureza e do nosso cotidiano, mas é difícil saber se ou quando ela começa a influenciar a realidade que, em tese, deveria apenas retratar. Entretanto, apesar da subjetividade envolvida no tema, existe ao menos um subgênero da arte em que existem evidências materiais suficientes para uma análise mais objetiva: a boa e velha ficção científica (sci-fi).


Esta forma de ficção surgiu no século XIX, quando a ciência moderna ainda era novidade e invenções "pipocavam" por todo lado. Os escritores de fantasia logo aproveitaram a curiosidade geral em relação às recentes descobertas da ciência, abordando em suas histórias, ainda de forma bastante fantasiosa, os impactos e possíveis desdobramentos da revolução tecnológica no mundo. Alguns autores, no entanto, começaram a se aprofundar cada vez mais na ciência, buscando sempre fundamentar suas histórias da forma mais coerente possível com as leis da física, astronomia, biologia, etc. A partir do gênio criativo de escritores extremamente imaginativos combinado com os últimos avanços teóricos e práticos da ciência, nasceu um gênero literário que, pela primeira vez, não tratava do mundo real ou mitológico, mas se preocupava em apresentar uma visão da realidade ampliada pelas possibilidades da ciência, da forma mais racional possível.


Pela primeira vez a literatura previa o futuro, não com base em misticismo ou especulação, mas por meio da lógica.
Júlio Verne (1828 - 1905), um dos pioneiros do sci-fi e autor de clássicos como 20.000 Léguas Submarinas, A Ilha Misteriosa [se você é fã de Lost precisa ler este último], A Volta ao Mundo em 80 Dias e Viagem ao Centro da Terra [não julgue estes dois últimos pelos filmes.

 Aliás, se ainda não viu os filmes, jamais veja], é um dos autores cujas previsões mais se aproximam da bruxaria. Em meados do século XIX, enquanto o mundo ainda era preto e branco, Verne escrevia sobre gadgets portáteis e redes de comunicação e informação ao redor do planeta. Em “20.000 Léguas Submarinas” o autor nos apresenta o submarino Nautilus, uma embarcação com autonomia ilimitada, controle da submersão a partir de tanques de lastro, motores e sistemas elétricos, baterias recarregáveis, sistemas de purificação do ar, enfim, nada que um bom submarino nuclear não ofereça. O livro foi publicado em 1870, quando os barcos a vela ainda nem tinham sido totalmente aposentados e viagens submarinas eram impensáveis.



As previsões tecnológicas de Júlio Verne são muitas, espalhadas por mais de 50 livros, mas é no clássico "Da Terra à Lua" que o autor mais abusa da bola de cristal. O livro narra uma viagem de exploração ao nosso satélite e inclui detalhes do planejamento da missão, análises do movimento dos dois astros, cálculos balísticos e gravitacionais, procedimentos de alunissagem e de retorno à Terra.  Na história de Verne o Columbiad, lançador da nave, é construído a 30 km de distância de Cabo Canaveral, onde 100 anos depois a Apollo 11 (cujo módulo foi batizado de Columbia) seria lançada pela NASA. Os astronautas de Verne também descem no oceano, onde são resgatados por um navio da Marinha. A missão de Verne custa US$ 12 bilhões. O programa Apollo custou US$ 14,4 bilhões. Nem mesmo o mês de lançamento da missão, dezembro, foi menos preciso na correspondência com a realidade. Tudo isso em um livro publicado em 1865, quando Sarney ainda estava em seu primeiro mandato como senador.
Júlio Verne não foi o único autor cuja capacidade de antecipação foi comprovada pelo tempo. H. G. Wells, Philip K. Dick, Arthur C. Clarke, Isaac Asimov [esse é o cara] e muitos outros conseguiram visualizar com precisão assustadora o futuro que hoje chamamos de presente e com probabilidade também assustadora o futuro que ainda chamamos de futuro. 


Muitos inventores do século XX reconheceram a relevância da obra de Júlio Verne e de outros mestres da ficção como inspiração para suas realizações práticas. O próprio Júlio Verne já dizia que o que pode ser imaginado pode ser inventado. Agora a questão é se a ficção apenas previu o futuro ou se também ajudou a construí-lo. Os autores de ficção tanto podem ter analisado os progressos da ciência e chegado a uma previsão lógica dos resultados como também podem ter motivado, com ideias próprias, os progressos futuros. Será que a tecnologia que conhecemos hoje estaria nesse mesmo nível se, há cento e tantos anos, esses caras não tivessem plantado as sementes?  Afinal, a ficção prevê a ciência ou a ciência imita a ficção?


Por David Duarte.

2 comentários:

  1. Fiquei impressionado mesmo, vi esse vídeo aqui que fala das previsões de Júlio Verne

    http://www.youtube.com/watch?v=5N6OHs_Nyn4&list=PLexwWhECXMOa8AUxj3jU-I9ERKcvEM4NL

    ResponderExcluir